terça-feira, 10 de maio de 2011

Breves Ponderações

Gustavo S. Cetlin, em seu artigo sobre "o tratamento ao usuário compulsivo de crack: fissuras no cotidiano profissional", ilustra brevemente o impacto do discurso hegemônico e das relações de poder-saber sobre a questão da escolha, neste campo. Aliás, este é um ponto bastante delicado de reflexão e parece ganhar ainda mais importância quando falamos de indivíduos que consomem crack.

Segundo Gustavo, na dupla nomeação do usuário, ora como dependente-doente, ora como criminoso o que está em jogo é justamente a anulação de sua capacidade e possibilidade de escolha: "a dependência é a nomeação de sua desautorização e a infração, sua desqualificação".

Esta frase faz eco e se dilata nos pensamentos daqueles que trabalham com a clínica. Ora, se o objetivo de nossas práticas - como profissionais de saúde - é favorecer encontros e experiências transformadoras, num movimento constante de priorização da centralidade do sujeito e de sua história; o que estamos fazendo quando recebemos um indivíduo que constitui uma relação de exclusividade com o crack e, já à priori, nos colocamos a dizer o que vai ser feito  e como deve ser feito? Será que estamos trabalhando em consonância com as diretrizes da saúde? Será que estamos viabilizando processos de fomento e expansão de autonomia?

Rosana Onocko Campos, em interessante debate a respeito da política nacional de Humanização, refere-se a uma diferenciação presente na ética aristotélica entre conhecimento técnico e conhecimento ético. No primeiro haveria sempre um saber prévio ao qual recorrer. Já na ética, "no mundo da ação não vale o saber, mas o "saber-se" em situação", para que apenas num segundo momento se possa empreender a busca por um conhecimento anterior.

Completando estas breves ponderações também Bergson nos oferece algo a pensar:
(...) “A idéia de que poderíamos ter de criar peça por peça, para um objeto novo, um novo conceito, talvez um novo método de pensar, repugna-nos profundamente. A história da filosofia está aí, no entanto, a nos mostrar o eterno conflito dos sistemas, a impossibilidade de fazer com que o real entre definitivamente nessas vestes de confecção que são nossos conceitos já prontos, a necessidade de trabalhar sob medida”.
(Bergson, 2005. A evolução criadora: p.52).

Referência (Rosana Onocko Campos): "Mudando os processos de subjetivação em prol da humanização da assistência".

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