quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Opinião: internações involuntárias


"Se a família pode fazer isso, e há controvérsias, o poder público não pode. Fora da crise, prevalece a vontade do indivíduo" (Januario Montone, Secretário Municipal de Saúde).
De fato ainda há muitas limitações. Agora, concordo com o posicionamento e considero bem estranho o "dado" de que 70% (de uma amostra de 151) nunca receberam oferta de tratamento. Na cracolândia? Onde diariamente transitam profissionais e voluntários das mais variadas instâncias? Parece coisa de quem não conhece o território e não sabe o que acontece no seu dia a dia.


http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/1145552-tendenciasdebates-combate-ao-crack-missao-de-quem-nao-desiste.shtml

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Pequenas Notas: 11. retratos

Como diria o Agamben este é o retrato da política moderna já que ela implica o desaparecimento da distinção entre polícia e política. Neste sentido, as ditas políticas de assistência e saúde se confundem com o combate e a luta contra o inimigo. Sãos os homines sacri contemporâneos, destituídos de qualquer valor político, vidas matáveis.
"A vida que, com as declarações dos direitos humanos tinha-se tornado o fundamento da soberania, torna-se agora o sujeito-objeto da política estatal (que se apresenta, portanto, sempre mais como "polícia"); mas somente um Estado fundado sobre a própria vida da nação podia identificar como sua vocação dominante a formação e tutela do "corpo popular" (Giorgio Agamben).

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Fique Ligado!

Essa discussão é bastante necessária: a internação compulsória como política de intervenção para usuários de crack em situação de rua.

http://migre.me/9RGpQ

domingo, 3 de junho de 2012

"Sociedade Fissurada" saiu no Estado de Minas.

Novos olhares sobre a sociedade Especialistas vêm a Belo Horizonte para refletir sobre o mundo contemporâneo. Ponto de partida é desmistificar discurso sobre as drogas

Luciane Evans
Publicação: 03/06/2012 04:00
A psicóloga Andréa Costa Dias 
e a filósofa Márcia Tiburi destacam o consumismo exacerbado como característica forte dos tempos atuais  (Fotos: Tomas Arthuzzi/Divulgação)
A psicóloga Andréa Costa Dias e a filósofa Márcia Tiburi destacam o consumismo exacerbado como característica forte dos tempos atuais

Maurício é viciado em crack. A pedra traz certeza para suas angústias da mesma forma que os antidepressivos deixam Joana certa de que a vida faz mais sentido e seu humor não altera a cada pílula ingerida. A mesma confiança tem Joice, para quem o melhor mesmo é emagrecer a qualquer preço. Semelhante satisfação tem Raul ao entrar no Facebook e curtir amizades virtuais sem se envolver. Esses personagens são fictícios, mas poderiam ser reais, e doa a quem doer, há muitos deles entre nós.

Com a ideia de que estamos todos no mesmo barco ao buscarmos respostas para nossas angústias e nos refugiarmos nas primeiras certezas que aparecem, sejam elas as drogas ilícitas, legais, o amor romântico, os discursos científicos e até a corrida pelo corpo ideal, a psicóloga clínica Andréa Costa Dias e a filósofa Márcia Tiburi desembarcam em Belo Horizonte, em 13 e 14 de junho, para discutir um novo conceito criado por elas como reflexão (ou um tapa na cara) para essa nossa realidade: o de uma “sociedade fissurada”.

A expressão, que logo nos remete ao linguajar de um viciado em drogas, é o título do livro que ambas estão escrevendo. Com a obra ainda aberta e com promessa de ser lançada no ano que vem, as escritoras escolheram BH para abrir a discussão e, com isso, encontrar novos questionamentos e, quem sabe até, respostas por meio do debate na cidade.

A palavra “fissura” vem mesmo da gíria de um dependente químico, mas elas querem quebrar o muro que há entre os usuários e a sociedade. Por isso, ao colocar todos no mesmo patamar, a ideia é discutir o vício não só pelo álcool, cigarro, drogas ilícitas, mas trazer à tona a dependência da sociedade das sensações que também são provenientes do dinheiro, da busca pela beleza, dos medicamentos e tantas outras promessas de felicidade. “Essa sociedade já está fissurada na busca de construir sentidos onde não há”, explica Márcia, apontando o capitalismo como fonte para essa fissura.

O ponto de partida desse diálogo é desmistificar o discurso sobre as drogas, que, segundo explica Andréa, sempre estiveram presentes na história da humanidade. “Pensar numa sociedade livre disso só serve para endossar um ideal de associação entre o que é proibido e a segurança. Decretar guerra às drogas é o mesmo que decretar guerras às pessoas. A sociedade passou a se dividir em grupos: drogados e não drogados, pensando que, no universo dos usuários, ela não faz parte deles. E não é bem assim”, defende, acrescentando que ao pensar que todos nós fazemos parte desse mundo permite que tenhamos um olhar sobre nós mesmos. “Acaba-se com a ideia de que o mal está no outro e, por isso, temos que combater o outro”, destaca Andréa. Ela deixa claro que não há uma apologia das drogas, mas a vontade de debater sobre o discurso totalitário que se formou sobre essas questões. “Os discursos que estão aí não dão brecha para novos olhares e estão intoxicados pela moral”, ressalta a psicóloga.

Andréa compara a lógica da indústria farmacêutica à do tráfico. “Ambas têm a mesma teoria, ao oferecer curar a dor de viver, a angústia que há em nós e nossos questionamentos. Estão imbuídas do mesmo pensamento. Por isso, queremos trazer essa discussão de que não existe divisão entre o mundo do drogado e o do resto”, diz. A ideia não é dizer que todo mundo tem um vício, mas, sim, falar sobre uma necessidade mais complexa e contundente. “Fissura tem a ver com urgência e com a certeza de que as drogas acenam como garantia de ser tudo aquilo de que necessitamos”, afirma.

Ao quebrar esse muro invisível que a sociedade cria entre os drogados, considerados marginais, e aqueles que não dependem disso para ter sua satisfação, as autoras dizem que todos os seres humanos estão em busca de algo para curar suas angústias. “Vivemos na época do culto às sensações. E essa busca está em todas as classes sociais. As menos favorecidas vão consumir um determinado produto para encontrar essas respostas. Assim como a classe alta”, diz Márcia, apontando o consumo desenfreado como uma das drogas dessa sociedade fissurada. “Será que precisamos comprar tantas coisas? A TV, a publicidade e o cinema lançam sobre nós estímulos estéticos. Existe uma analogia entre os estímulos externos e os que saem dos objetos. Até a música é análoga aos estímulos que recebemos das drogas, sempre é o nosso corpo que será atingido.”
Vivemos na época do culto às sensações. E essa busca está em todas as classes sociais - Márcia Tiburi,  filósofa
Vivemos na época do culto às sensações. E essa busca está em todas as classes sociais - Márcia Tiburi, filósofa

A LONGO PRAZO Ao comparar uma pessoa que fuma maconha e outra que não consegue tirar os olhos da TV, por exemplo, Márcia reconhece que os efeitos são diferentes. “A erva pode torná-la mais lenta, distraída, mas é algo imediato. Já a TV vai fazer isso a longo prazo”, compara. O mesmo ocorre, segundo ela, com os viciados nas marcas. “A pessoa fica em paz no instante em que acredita na plenitude dos objetos em questão. Usam objetos, futebol, Deus, comida, o Facebook, o emagrecimento e outros para tapear a fissura mais fundamental, a da busca de sentido, por não saberem o que estão fazendo neste mundo. A sociedade não está feliz, mas encontrou muitos objetos para colocar na infelicidade incompreendida. Eles passaram a ser a resposta para o vazio e para a solidão. Aceita-se qualquer certeza, como forma de se tapear mais depressa, fingindo, assim, não se ter mais ferida.”

A cura para essa fissura, segundo apontam as autoras, está na reflexão. É por meio do diálogo que as especialistas acreditam que a sociedade poderá ter a resposta para a sua busca de sentidos. “A sociedade está rachada, apartada da possibilidade de pensar e refletir criticamente sobre o cotidiano e fazer suas próprias escolhas”, apimenta Andréa.

INSPIRAÇÃO

Uma das inspirações para o livro de Andréa Costa Dias e Márcia Tiburi é o filme Réquiem para um sonho, do diretor Darren Aronofsky. O longa conta a história de Harry Goldfarb (Jared Leto) e Marion Silver (Jennifer Connelly), um casal apaixonado, que sonha montar um pequeno negócio e viver feliz. Mas os dois são viciados em heroína. Já Sara, mãe de Harry, é viciada em assistir a programas de TV. Até que um dia recebe um convite para participar de seu show favorito, o Tappy Tibbons Show. Para usar seu vestido predileto, ela começa a tomar pílulas de emagrecimento e se torna viciada no medicamento.

>> SERVIÇO

O debate está dividido em quatro temas: “Sociedade fissurada – ética, estética e política da sensação”, “As drogas e o discurso da ciência”, “A fissura nossa de
cada dia” e “O que nos aproxima dos fissurados

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Breves Ponderações

E falando sobre drogas (ainda vai um longo outono na labuta da escrita do livro Sociedade Fissurada).

Uma discussão que se processa no compasso de um regime de dualidades - “a favor” ou “contra”, proibido ou permitido, leve ou pesado, nocivo ou não nocivo - nos revela a pequenez de suas fronteiras e desfaz a aparente disponibilidade para a efetiva conversação. Com efeito, informa-nos sobre o eficiente artifício de silenciamento do debate a tal ponto que nos transforma em fantoches apassivados diante de um objeto-tabu.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Breves Ponderações

Estava relendo o Melman (2000) e achei muito oportuno (especialmente pensando na coluna do Contardo de hoje na Folha):
"De que gozo podemos dizer que é uma doença? Será que estamos em condições de falar de uma normalidade, de uma norma em matéria de gozo, de dizer "este é o bom, aquele lá não é"?"
Falando em toxicomania ele acrescenta um ponto interessante sobre a "terapêutica" que se orienta pela via da imposição da abstinência. Ela, ao invés de colaborar para "extinguir" o consumo (como diriam os behavioristas - vigilantes do comportamento), reinveste eroticamente, ou seja, potencializa, fortalece o circuito de uso. Vale lembrar que a abstinência, o "estado de falta" também compõe o ritual da droga e, portanto faz parte do "barato". Isso fica mais claro lendo o Bill Clegg em "Retrato de um viciado quando jovem" e acompanhando seus incansáveis malabarismos - quando ainda na falta da droga - para conseguir viabilizar seu uso: a negociação, o suprimento de crack, o local, o momento, etc. Todo um pecurso pré-entorpecimento que "engrandece" o próprio efeito.

Ps: apontamentos para o início da escrita do livro "Sociedade Fissurada" (pela Record) que escrevo em parceria com minha amiga Márcia Tiburi.

Fique ligado! Reflexões sobre biopoder

Contardo Calligaris - Folha de São Paulo

Os diferentes são todos doentes?
Aconteceu no mesmo dia. Primeiro, houve uma mãe falando da homossexualidade do filho, que ela, em tese, acabava de descobrir: "É uma doença, não é?", perguntou. Ela queria encontrar, na minha confirmação, uma razão de perdoar o filho por ele ser como é.

Mais tarde, alguém, falando de um parente próximo que é toxicômano, afirmou mais do que perguntou: "Ele é doente" -no tom de quem procura uma confirmação que permita perdoar o inelutável.

Nos dois casos, respondi com cautela, mais ou menos desta forma: "Certo, deve haver razões para ele ser assim, mas ele não é doente como alguém que pega um vírus ou uma bactéria, nem como alguém que seja invadido por um câncer".

A observação convidava meus interlocutores a questionar o que eles entendiam por "doente".

A mãe do primeiro exemplo acrescentou que, de fato, não devia se tratar tanto de uma doença quanto de uma disposição genética.

Meu segundo interlocutor poderia ter dito a mesma coisa. Afinal, logo na sexta passada, a revista "Science" publicou uma pesquisa de Karen Ersche, da Universidade de Cambridge (Reino Unido), defendendo a tese de que existe uma predisposição genética à toxicomania (veja-se o caderno "Saúde" da Folha de 3 de fevereiro e o texto original por www.migre.me/7OLiy -de fato, sem entrar em detalhes, a pesquisa de Ersche mostra que deve haver uma predisposição genética à toxicomania, embora essa predisposição não sele o destino de ninguém).

Desde quinta-feira passada, também recebi vários comentários à minha última coluna: muitos diziam que, claro, "cross-dressers", travestis e transexuais devem ser tratados com respeito por uma razão simples: "eles são doentes".

Parece que a possibilidade de respeitar a diferença passa pelo reconhecimento de que essa diferença constitui uma patologia ou uma espécie de malformação congênita (no fundo, a exceção genética é isso).

Alguns perguntarão: "não é melhor assim?". Sem essa "injeção" de patologia (ou de teratologia), os diferentes seriam apenas julgados em nome de um moralismo qualquer: os drogados seriam vagabundos, os homossexuais, sem-vergonhas, e, quanto aos "cross-dressers" e etc., nem se fala.

Em outras palavras, a substituição da moral tradicional ou religiosa pela medicina, em geral, produz uma nova tolerância das diferenças: elas não são punidas, são diagnosticadas.

Mais um exemplo. Obviamente, para nossa proteção, não deixamos de prender os criminosos, mas já "sabemos" que muitos deles não são "ruins", eles só têm um problema de córtex pré-frontal -por causa dessa malformação, continuam impulsivos que nem adolescentes.

O neurocientista David Eagleman ("Incógnito", ed. Rocco) chegou a propor que a gente treine nossos criminosos de modo que eles gozem de uma "normalidade" cerebral parecida com a da gente. Aí, sim, poderíamos condená-los com toda justiça. Sem isso, puniríamos "doentes", não é?

Perdoamos facilmente, mas não é por misericórdia ou compreensão, é porque respeitamos e desculpamos doentes e vítimas de anomalias genéticas. É um progresso?

Acima de seu sistema jurídico, cada sociedade produz e alimenta um sistema de crenças, regras e expectativas que facilita a coexistência mais ou menos harmoniosa de seus cidadãos.

Para essa função, a modernidade escolheu a medicina (do corpo e das almas). Com isso, o controle sobre nossas vidas seria aparentemente mais suave, mais "liberal". Mas é só uma aparência.

Pense bem. Certo, se toda exceção ou anormalidade for doença ou malformação, os diferentes não serão propriamente punidos. No entanto, a sociedade esperará que eles sejam "curados".

Outro "problema": se os desvios da norma forem tolerados por serem efeitos de doença ou malformação, o que aconteceria com quem pratica desvios, mas não apresenta as "malformações" que o desculpariam?

O que acontece se eu quero me drogar, ser "cross-dresser" ou, mais geralmente, infrator só porque estou a fim de uma "farra" e sem poder alegar nenhuma das predisposições genéticas para essas "condições"? Aí vai ser o quê? Voltamos às punições corporais?

Em suma, gostaria que fosse possível ser anormal sem ser "doente". E, se fosse o caso, me sentiria mais livre sendo punido do que sendo "curado".

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Pequenas Notas: 10. à queima roupa

Mais uma vez as coisas ficam bem explícitas. Cidade vazia e operação cracolândia rolando solta, sendo chamada ironicamente de ação integrada. Bem, de fato duas instâncias se articulam: a polícia "dispersando a área" e o caminhão de lixo "limpando o entorno".

Afinal, para o poder público (e a população, no geral) usuário de crack ou é marginal ou é descarte, refugo.